Imagine um cliente buscar o nome do seu concorrente no Google e encontrar um anúncio da sua empresa em primeiro lugar. A estratégia, que a princípio pode soar como inteligente, pode ser na verdade ilegal.
Uma ação movida contra a VP Viagem e Turismo foi deferida no último dia 23, em sessão realizada pela 4ª turma do STJ. A agência de turismo foi impedida de usar o nome de um concorrente em links patrocinados em sites de buscas, e condenada a pagar R$ 10 mil de multa por danos morais.
O processo, iniciado pela Braun Passagens e Turismo, analisava a prática da VP Viagens de utilizar os termos “Braun Passagens” e “Braun Turismo” como palavras-chave em suas campanhas digitais em anúncios de pesquisa do Google Ads.
Dessa forma, a página Voupra.com, que pertence à VP Viagem e Turismo, apareceria como primeira opção aos usuários que buscassem os termos com o nome do concorrente, gerando, segundo a empresa reclamante, desvio de clientes e confusões para o consumidor.
O que disse a justiça sobre nome de concorrente
Em primeira instância, o TJSP acolheu a acusação, reconhecendo o uso indevido da marca e prática de concorrência desleal, fixando a indenização em R$ 10 mil.
No recurso, a empresa acusada alegou que a captação de clientes é inerente a qualquer atividade econômica, especialmente no âmbito do e-commerce.
Entretanto, o ministro do caso, Luis Felipe Salomão lembrou que o artigo 195 da Lei de Propriedade Industrial estabelece como crime de concorrência desleal o emprego de meio fraudulento para desviar, em proveito próprio ou alheio, os clientes de outra empresa.
O ministro considerou que a utilização de marca de outra empresa como palavra-chave no Google Ads para direcionar o consumidor do produto concorrente pode causar confusão quanto à atividade exercida por ambas as empresas.
O estímulo à livre iniciativa, dentro ou fora da rede mundial de computadores, deve conhecer limites, sendo inconcebível reconhecer lícita conduta que cause confusão ou associação proposital à marca de terceiro atuante no mesmo nicho de mercado – concluiu o ministro.
Ainda no recurso julgado, a empresa acusada alegou que não tinha intenção de desviar clientes, mas de se destacar nos resultados de buscas de seu segmento. Apesar da declaração, a atitude foi considerada ilegal e, por isso, o caso foi concluído mantendo a punição à agência.
Uma discussão antiga
Recentemente, a Keep Light processou o Google, contestando o uso indevido de sua marca em campanhas de publicidade no Google Ads pela concorrente, Gym Chef. Em março deste ano, a 1ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem de São Paulo revogou a decisão que previa uma indenização de R$ 30 mil por danos morais.
Na ocasião, André Salomon Tudisco, juiz responsável pelo caso, afirmou que a prática não constitui crime de concorrência desleal, pela não ocorrência de venda ou oferta à venda do produto.
A indicação de uma marca como palavra-chave serve tão somente de gatilho para disparar os anúncios dos fornecedores e apresentar uma lista de resultados ao usuário, procedimento este que não constitui em “venda” ou “oferta à venda” do produto, muito menos crime de concorrência desleal pelo desvio fraudulento de clientela – relatou Tudisco.
Na sentença do caso, Tudisco acrescentou que pessoas de entendimento mediano são capazes de identificar que o site anunciado não vende as mercadorias da marca buscada, podendo optar pelo site oficial, que também se encontra como resultado da busca. Ele afirmou que esse detalhe é crucial para a descaracterização do Google Ads como prática de concorrência desleal.
Bloqueio de palavra-chave no Google Ads
O uso de nomes de marcas concorrentes como palavras-chave em campanhas de marketing já é uma discussão antiga entre as empresas. Na maioria das vezes, a prática é considerada como uma atitude desleal e antiética, já que existem diversas outras maneiras de obter visibilidade no meio digital.
Apesar do processo burocrático, é possível fazer o bloqueio de palavras-chave no Google Ads e evitar que um concorrente utilize o nome de sua empresa em campanhas de publicidade. De acordo com Rafael Rez, fundador e CMO da Web Estratégia, a falta de informação faz com que poucas empresas usem do artificio ao seu favor.
Se uma marca é registrada no INPI e o detentor entra com o processo de bloqueio junto ao sistema do Google Ads, a palavra-chave com a marca empresarial não pode mais ser comprada, mas pouquíssimas empresas fazem isso, tanto pela falta de informação, quanto pelas dificuldades do processo – explica Rez.
O empresário acredita que existem diversas outras estratégias para que se possa obter resultados positivos nas campanhas digitais e evitar que uma empresa tenha problemas judiciais e que clientes sejam prejudicados:
A criação de conteúdos otimizados, o uso de boas práticas de otimização e de tecnologias de inteligência competitiva permitem monitorar o site, o volume de vendas, os anúncios e os conteúdos criados pelo concorrente, trazendo vantagens competitivas capazes de te colocar à frente dos seus concorrentes.
Rafael Rez lembrou, ainda, que a má conduta das marcas pode fazer com que consumidores julguem a estratégia como desleal e tenham uma visão negativa sobre a empresa que utiliza o nome do concorrente em seus anúncios na internet.
Como profissional de marketing, a recomendação é sempre investir no próprio branding e na construção de uma relação próxima com os clientes do que tentar roubar clientes do concorrente usando este tipo de estratégia. E quando isso vira assunto na mídia, fica pior ainda – finaliza.